
I can barely recall
But it’s all coming back to me nowEu mal consigo me lembrar
It’s All Coming Back To Me Now – Celine Dion
Mas está tudo voltando para mim agora
Alguns dias atrás, eu estava meio de bode e decidi que não passaria a noite de sábado enfurnada em casa. Eu tinha passado o dia fazendo faxina e escrevendo sob encomenda e precisava respirar um ar diferente não só para descansar a cabeça, mas também para encontrar inspiração para começar bem o domingo (no qual eu continuaria escrevendo, mas menos, porque os meninos estariam de volta e vida de mãe é sempre cheia de afazeres diversos). Então eu decidi: vou me dar uma noite de cinema. E assim o fiz!
Noite de cinema? Sim! Me levei para jantar, tomei um vinho, escolhi um cinema maravilhoso e fui ver um filme com a Celine Dion, uma comédia romântica com todos aqueles ingredientes óbvios para que a gente deixe um balde de lágrimas no cinema e saia de lá com a esperança de que o crush um dia se lembre que a gente existe, porque as comédias românticas só têm sentido até a gente encontrar a tampa da panela, o chinelo velho pros pés cansados, o açúcar do Sucrilhos (que me perdoem os fitness, mas comer cereal de milho sem açúcar é pior que comer tempero sem miojo, um verdadeiro experimento de como a vida pode ser insossa e sem graça). Eu acho que eu seria capaz de fazer mil associações divertidas e verdadeiras sobre o prazer de encontrar um grande amor, mas guardarei para uma outra ocasião.
Voltemos ao filme. O roteiro contava a história de uma escritora que, ao perder o grande amor da sua vida, seu noivo, atropelado por um carro, se vê entregue ao luto, inevitável e não desejado. E ela se entrega a esse luto por dois anos, sem forças para voltar a escrever e retomar sua vida em Nova York. Por insistência da irmã, ela volta para a cidade que nunca dorme e passa a reencontrar seus amigos, as coisas que ama e a história que construiu ali entre aquelas paredes e não paredes de concreto e sonhos. Todos nós temos nossos próprios lutos e devemos encontrar maneiras próprias de superá-los. E ali no filme ficava muito claro que estar com pessoas que nos amam e respeitam a nossa dor e o nosso tempo, qualquer que seja o nosso luto, é fundamental para que possamos sair dele mais fortes do que entramos.
E a nossa heroína escritora (qualquer semelhança é mera coincidência) encontra um meio de superar a sua dor: começa a escrever seus textos para o celular do antigo namorado, contando nas mensagens como se sente, os esforços que têm feito para retomar a vida, além de compartilhar com ele os seus pensamentos diários sobre os caminhos que se abrem nessa retomada. É meio mórbido, mas ao mesmo tempo bonito, pois o amor não se acaba simplesmente porque o ser amado morre. Quem amamos é sempre parte de nós, do que somos, do que sonhamos e do que acreditamos e o filme tem méritos ao nos mostrar isso. E assim, por conta dessas mensagens, recebidas pelo novo dono do celular, a história desenrola-se naqueles enredos típicos de filmes de amor, cheios de suspiros, romance e lágrimas até o ocaso da felicidade ao final.
Muito legal a minha noite de cinema, mas eu não escreveria sobre esse filme se ele não tivesse como pano de fundo as canções da minha diva da adolescência, a Celine Dion. Aliás, a própria Celine interpreta ela mesma na história, fazendo o papel de conselheira do herói romântico, um jornalista que também tem como meio de vida a escrita de contos sobre a vida cotidiana. E ali, em cada música, em cada cena, eu me recordava de como as músicas da Celine embalaram tantos dos meus sonhos de amor e de vida.
O filme terminou e eu estava contagiada de música. Coloquei a Celine no carro no último volume para me fazer companhia pelas ruas vazias de uma cidade fria num sábado à noite. Tocou uma música, tocou outra, até que no som começaram os acordes de Because You Loved Me. a minha música predileta da Celine (eu sei que hoje All By Myself combina mais com essas noites de sábado solitárias, mas isso não vem ao caso). E como é bom reencontrar um grande amor, mesmo que seja uma cena, um livro, uma música.
Eu tinha 16 anos quando eu conheci Because You Loved Me estava numa fase um tanto confusa da minha vida. Eu queria ser freira, mas ao mesmo tempo tinha vontade de viver uma história de amor incrível, na qual eu fosse uma heroína de um filme antigo e saísse pelas ruas da cidade usando meus vestidos de vó. Mas já naquela época eu achava que amor era uma coisa muito complicada, pois eu via todas as minhas amigas cercadas de garotos e eu com um monte de espinhas na cara, usando moletons dois números além do meu tamanho e passando todo o meu tempo livre ouvindo música velha, vendo filme velho, lendo livros velhos e cercada pelas velhas da Igreja que eu coordenava na Pastoral dos Ministros da Eucaristia. Ou seja, eu tinha 16 anos, mas vivia a vida de quem tinha 60, usando meus domingos para visitar velhinhos doentes em suas casas e levar a Santa Eucaristia e a Palavra de Deus para eles. Agora me lembrei dos meus velhinhos e fiquei com saudades. E foi sendo essa pessoa que eu ouvi Because You Loved Me pela primeira vez.
Eu sempre tive problemas de autoestima, eu nunca me senti parte das coisas, porque desde sempre eu pareço ser diferente. E por ser assim, eu sempre encontrei na minha fé um refúgio, como se Deus, por ser Deus, fosse de fato capaz de me entender e entender essa confusão da minha alma. Enquanto eu queria genuinamente ser uma freira carmelita e ao mesmo tempo conhecer um príncipe encantado que me levasse ao altar, eu ouvia Because You Loved Me para dizer a Deus que, naquela confusão, eu sabia Ele sempre me amou e iria me amar para sempre, escolhesse eu qualquer um dos caminhos, porque amor é liberdade, é Deus nos fez livres para sermos felizes.
Because You Loved Me se tornou, desde então, a minha oração, a música a qual eu recorro quando preciso me lembrar não só de quem eu sou, mas também do que acredito e aonde quero chegar. E foi bom reencontrar essa sensação numa noite em que eu genuinamente precisava me sentir amada por Deus.
You gave me wings and made me fly
Because You Loved Me – Celine Dion
You touched my hand I could touch the sky
I lost my faith, you gave it back to me
You said no star was out of reach
You stood by me and I stood tall
I had your love I had it all
I’m grateful for each day you gave me
Maybe I don’t know that much
But I know this much is true
I was blessed because I was loved by you
Você me deu asas e me fez voar
Você tocou minha mão, eu toquei o céu
Eu perdi minha fé, você me trouxe ela de volta
Você disse que nenhuma estrela estava fora de alcance
Você ficou do meu lado, e eu suportei
Eu tive seu amor, eu tive tudo
Eu sou grata por esses dias que você me deu
Talvez eu não saiba muito disso
Mas eu sei que isto é muito verdadeiro
Eu fui abençoada porque eu fui amada por você
Como diz a canção principal do filme: “It’s all coming back to me now”, ou “Tudo está voltando para mim agora”. Eis a mensagem de amor que recebi quando, sem eu pedir, o Cara lá de cima me fez companhia no cinema e resolveu me lembrar de que sempre é tempo de superar o luto que vira e mexe toma conta da minha alma. E quando a gente supera o luto, seja ele qual for, temos a obrigação de abrir a janela do carro da vida e gritar bem alto a nossa felicidade em reencontrar o caminho de volta para casa! 🙂